O Que Você Jamais Deve Fazer é Se Culpar Pelo Ocorrido
A imagem da cena de traição e do susto costuma ser a mais dramática: a mulher chega em casa e flagra o marido na cama com outro. Mas, certamente, a maioria das histórias de verdade sobre mulheres que descobrem - ou desconfiam - que o parceiro é gay nem sempre vem acompanhada por uma evidência tão forte. Também não necessariamente acaba em drama. No Brasil, aliás, há até um "movimento" de mulheres que sentem atração por homens que gostam de homens. Inspiradas ou não pela paixão entre Céu (Deborah Secco) e o assumido Orlandinho (Iran Malfitano), na novela "A Favorita", elas têm até o apelido de Maria Purpurina.
Reações e preferências à parte, o fato é que o assunto ainda gera polêmica, preconceito e dúvidas. Por que, afinal, alguns homens com tendências homossexuais ainda mantêm um casamento com uma mulher? Na opinião da psicóloga clínica Pamela Verdugo, terapeuta familiar e de casais, quando uma mulher está estabelecida em uma relação com um homem e este tem uma orientação "homo-bissexual", na maioria das vezes, isso ocorre porque ele não tem suas preferências sexuais esclarecidas e, por isso, vive um conflito devido à pressão social que implica em "se assumir".
Uma das explicações para a linha que divide a postura hétero da homossexualidade, segundo Paula Muñoz, psicóloga e especialista em gênero e cultura, é que hoje a sociedade produz diferentes tipos de masculinidade. "Os homens já não têm que ser feios e peludos, e a partir desse ponto, nasce o conceito do metrossexual, aquele que segue a tendência fashion, é sensível, que nos entende. E isso se mostra mais atraente para a mulher, que se sente mais protegida", afirma.
Quando a relação chega até ao casamento, muitas vezes esse laço foi construído baseado em outros aspectos. Nesses casos, a necessidade de estar ao lado de alguém é mais forte que encarar a situação. Pesam mais os julgamentos sociais, como se manter como pai perante os filhos. Para a psicóloga Sueli Castillo, o mundo ainda é altamente machista, e torna-se difícil para um homem, criado para ser "macho", assumir que não é essa a vida que deseja. "O medo e a insegurança são maiores, por isso ainda ocorre a repressão dos desejos sexuais. Além de enfrentar normas e regras vigentes, é preciso enfrentar a família e, por vezes, isolar-se de todos e conviver quase que em guetos", complementa Sueli.
Passos para enfrentar a situação
O fim de um relacionamento não está no rol das coisas mais fáceis do mundo a serem encaradas. E, quando ele termina por causa da orientação sexual do homem, fica mais difícil ainda de entender. "O importante é a mulher não destruir sua auto-estima e perceber que o ocorrido não está associado à ela. O companheiro não a rejeitou e sim optou pelo gênero masculino do qual ela não faz parte", orienta Sueli Castillo.
Confira a seguir algumas dicas:
● Mantenha a calma. A orientação sexual de uma pessoa é um processo individual, não depende do parceiro e, geralmente, se define ainda na adolescência. Não assumi-la pode ser reflexo do medo de conflitos sociais que tal atitude pode gerar;
● Esclareça todas as suas dúvidas com o parceiro. Mas, para tal conversa, escolha as palavras certas, assim como em qualquer outro assunto delicado;
● É preciso saber se o seu marido vai seguir uma orientação homo ou bissexual ou se o que houve foram apenas experiências. Você deve questionar se podem continuar juntos e se ele está "disponível" para permanecer ao seu lado e de que forma. Qualquer que sejam as respostas, procure entender que essa é uma decisão de sua exclusiva responsabilidade e que o caminho para a harmonia do casal está relacionado à sua capacidade de entender a situação e perdoar;
● A única coisa que você jamais deve fazer é se culpar pelo ocorrido. Aqui, não cabe nenhum questionamento do tipo: "não fui atrativa o suficiente?", "será que se eu melhorar posso reconquistá-lo?". É preciso se dar conta de que a situação não depende de você. O processo que define a orientação sexual é algo estritamente pessoal.
Veja abaixo, alguns depoimentos:
"Ele mentiu para mim"
"Eu tive um relacionamento com um homem e somente depois de oito meses descobri que ele era gay. Meu ex mentiu para mim, e digo isso porque ele sempre teve sua postura sexual bem definida, mas nunca me contou nada. Ele era sensível, terno e, na cama, era normal, não fazia e nem me pedia coisas "diferentes". No fim de semana, ele desaparecia, porque saia com amigos. E foram essas escapadas que me fizeram descobrir a verdade: ele era gay e mantinha o nosso relacionamento para tranqüilizar a família.
Em um encontro entre amigos, o primo de uma amiga, que era homossexual assumido, ao ver o meu ex, agiu de forma estranha: Pato ficou calado a noite toda. No outro dia, minha amiga me procurou para dizer que Pato havia visto meu namorado em uma balada gay. Eu não quis acreditar, pensei que tivesse sido um equívoco, mas fiquei com aquilo na cabeça. Passei a observá-lo mais atentamente, procurava por pistas no celular, nos bolsos; e encontrei. Encontrei mensagens de texto de outro homem com indicações evidentemente amorosas. Nesse instante, a raiva entrou em mim e nunca mais me deixou.
Eu o enfrentei e disse muitas coisas fortes, inclusive o ameacei de espalhar a verdade a todos. Eu lhe perguntava "por que eu?", "por que ele tinha feito tudo aquilo comigo?". Eu não merecia. Tem sido um processo difícil e prolongado entender o ocorrido. Me senti suja e culpada por não ter sido mais inteligente e ter me dado conta antes de que ele só estava me usando. Ele mentiu da pior forma e eu não sei como perdoá-lo."
Johanna, 26 anos
"Gosto de homens. Como você não percebeu isso?"
"Durante muitos anos Javier e eu fomos grandes amigos. Íamos para todos os lados juntos: compras, baladas, bares. Nessa época, as coisas estavam difíceis na minha casa e ele me dava todo o apoio. Trabalhávamos na mesma empresa, compartilhávamos o almoço e a volta para casa. Pouco a pouco comecei a entender que me encantava com a maneira em que convivíamos no dia-a-dia, e me apaixonei. As coisas começaram a ficar diferentes a partir do momento que me reconheci como apaixonada.
Creio que ele se deu conta, porque não me disse nada e ficou mais calado que de costume. Disse a ele o que sentia. No meio das minhas declarações, ele me calou com suas mãos e me disse com uns olhos tristes: "Pôxa gata, eu gosto de homens. Como você não percebeu isso antes?". Chorando, ele me contou que era difícil falar sobre isso e que seus poucos romances ocorreram na máxima clandestinidade. No começo, eu senti muita raiva e vergonha. Tentei me lembrar de momentos que, se eu tivesse sido mais esperta, poderia ter percebido sua orientação sexual. Busquei por frases, detalhes, mas não encontrei nada.
Ele não me procurou, mas eu fui em sua busca, pensando que ele poderia estar enganado, crendo que o nosso carinho era muito maior que o que ele sentia por outros. Nesse ponto é que as coisas se complicaram, porque eu o induzia a reconhecer algo, mas eu o confundi, pois na realidade ele nunca havia mentido para mim. Minha auto-estima estava no chão e em várias situações tentei beijá-lo, quando ele me abraçava. Demorei muito para entender que ele jamais me desejaria como mulher. E, com muita dor em minha alma, deixei de vê-lo. Esta foi a única forma que encontrei para esquecer de tudo."
Alejandra, 25 anos
"Até que eu morra, eles jamais saberão"
"Estive casado por quase 20 anos com uma mulher, apesar de gostar de homens.”
É muito difícil explicar como é possível viver dessa forma durante anos. Mas é preciso entender que eu amava essa mulher e amo os filhos que tive com ela, e, até que eu morra, eles jamais saberão sobre isso. A separação ocorreu, porque eu a flagrei com outro homem, e ela se foi com ele. Eu fiquei com meus filhos e tenho tentado ser um pai exemplar. Claro que tenho minha vida a portas fechadas, pois meus filhos me dão tanta felicidade, da qual eu não posso renunciar. Acredito que expor minhas preferências sexuais causaria danos aos meus filhos. Por isso, acho que é justo guardar a minha intimidade somente para mim."
Pablo, 48 anos
Fonte: www.terra.com.br