Deborah Secco fala sobre fama, trabalho e maturidade
A voz, famosa pelo tom rouco, continua a mesma. Mas Deborah Secco, além da quinta mudança na cor e no comprimento do cabelo somente em 2010, parece ter mudado por dentro. Fez 31 anos, 23 de carreira, e passou por crise no casamento com o jogador de futebol Roger que foi, segundo ela, indevidamente explorada pela mídia. Mas não vê só esse momento como seu turning point. Ela cita as viagens que fez ao Catar, onde morou o marido, e a experiência de viver a ex-garota de programa Bruna Surfistinha no cinema como outras justificativas para sua serenidade aparente. Enquanto aguarda a estreia do longa de Marcus Baldini, mês que vem, a atriz vem arrancando elogios por sua comicidade na novela Insensato Coração, da Globo, onde vive uma ex-participante de reality show. Confira trechos da entrevista.
O que as pessoas buscam num reality show, de onde saiu sua personagem em Insensato Coração: fama, reconhecimento ou dinheiro?
Acho que varia. Há quem busque fama e queira emendar carreira artística, os que querem levar R$ 1,5 milhão de um BBB, e gente que saiu de lá e faturou com a mídia imediatista. Ela gera dinheiro para quem está em dificuldade e quer abrir um consultório, por exemplo. Mas hoje existe, sem dúvida, gente que quer simplesmente ser famosa. Diferente de quando comecei, há 23 anos.
Fama é uma maneira de as pessoas serem endossadas por outras?
Há uma frase no filme da Bruna que eu adoro: “Eu entendi porque as pessoas querem ser populares, é que elas querem ser amadas”. Acho que essa carência de amor é falsamente suprida pela fama. Na verdade, as pessoas amam alguém que elas não conhecem. Tipo: “Nossa, amo a Deborah Secco!”. Mas quem eu sou?
Quem é Deborah Secco?
Ah, isso é para muito poucos (risos). Eu sou completamente normal. Meu cotidiano tem o mesmo tédio e euforia que existe na vida de qualquer ser humano. Por isso bato tanto nessa tecla de não falar de minha vida pessoal. Ela não tem nada enriquecedor para transmitir. Talvez se tivesse superado uma doença grave, uma história que acrescentasse à vida das pessoas. “Ah, mas seu casamento passou por uma crise!”. Sim, casamento, né? Todos são iguais. “Ah, mas você foi à academia!”. Sim, eu faço ginástica.
Por ser “amada”, essas pessoas que consomem seu trabalho têm direito à sua intimidade?
Não, acho que não. É minha a intimidade. Mas fico muito feliz que gostem de mim ou queiram conferir meu trabalho, mas daí a entrar no que eu sou… É esse mundinho que me dá inspiração para criar meus personagens. Se esse lugar for devassado, não tenho mais o que apresentar para o público.
Isso é conclusão recente? Antigamente não era mais exposta?
Isso sempre foi uma certeza minha. Mas no passado era imatura e meu foco, outro: estava mais preocupada em fazer meu trabalho do que saber o que as pessoas falavam de mim. Também nunca me escondi porque não fiz nada de ilícito.
Qual foi esse turning point? A crise no casamento com Roger, registrada por toda a mídia?
Não. Foi antes disso. Comecei uma batalha árdua para retroceder, explicar para as pessoas que não era bem assim, que falava de minha vida com naturalidade porque achava que elas eram minha amigas e tal. Era imatura, como disse. Tudo começou muito cedo na minha vida. Nunca houve ninguém famoso na minha família, né? Então, não aprendi em casa. Não vi que era observada. Pensava que era a observadora. Quando essa realidade veio à tona foi um caminho super difícil e ainda é. Primeiro tive que aprender a dizer não, coisa que não sabia fazer. Conheço várias colegas de profissão que criam personagens para a imprensa e eu não quero viver um.
Não é de frequentar o Leblon?
Nunca frequentei, na verdade. Nasci em Jacarepaguá. Meu primeiro apartamento foi na Barra (da Tijuca), para onde a gente se mudou. Depois consegui comprar outro apartamento para minha família, também na Barra. Hoje estou no Recreio. É coisa minha. Não gosto da noite, confusão, barulho. Nunca fui a boates, a não ser para fazer presença e trabalhar. Também não gosto de barzinho. Quando saio, no máximo vejo um filme ou uma peça e janto em casa de amigos. É muito difícil me achar. O lugar onde me fotografam é saindo da academia. Sou muito caseira mesmo. Os meus dias de folga passo na casa da minha mãe ou fico em casa pensando ou lendo. A solidão me alimenta. A gente fala tanta coisa e é tão visto que gosto de ficar escondida.
Você nasceu em Jacarepaguá, veio de família de classe média baixa. Quais seus sonhos de menina que conseguiu realizar?
Só queria ser atriz. Não tinha ambição material. Sempre me achei muito rica porque éramos uma família muito feliz. Você tem aquilo que você conhece, né? Eu não conhecia Chanel, por exemplo. Nunca fui frustrada. Queria estabilidade, casa própria, dinheiro para emergências de saúde. Isso eu conquistei.
Você tinha ídolos?
Não. Tinha metas. Quando menina, dizia que meu nome seria o primeiro da novela antes dos 25 e com menos de 50 eu ganharia Oscar. Meu nome foi o primeiro, de fato, quando estrelei América (novela de Glória Perez). Só falta o Oscar (risos).
Assustou-se com a história de Bruna Surfistinha antes do filme?
Não havia lido o livro. Tinha só ouvido falar que era a garota de programa mais famosa do País. Quando chegou o roteiro, disse: “Nossa, que personagem incrível!”. Uma menina de 17 anos que sai de casa por opção, entra num mundo de baixo nível, vai crescendo na carência de ser desejada, vira “a” garota de programa e se destrói com as drogas. Realmente foi grande um desafio como atriz, especialmente por filmar desordenadamente.
E a experiência de frequentar o Catar por causa do seu marido, que morava lá? Outro desafio?
Foi uma aula, mexeu muito comigo. Descobri que a cultura islâmica é enorme e que o mundo é muito, muito, muito maior que a gente imagina. E a gente, muito pequenininho. Eu achava, por exemplo, que conhecia pessoas ricas, mas eu as conheci no Catar! (risos) Vi caras que moram em tendas no deserto, outros em palácios com quatro mulheres. O que é certo ou errado? O certo é o que faz a gente feliz. Você entende que aconteceu tudo junto? Fui pro Catar, fiz a Bruna… A gente é o que consegue ser.
Está otimista com o Brasil?
Não. Torço muito para que apareça uma pessoa que vá mudar o Brasil e não a própria vida.
Fonte: Blog Estadão